A imponderabilidade marca a conjuntura política do Brasil, em meio à pandemia. Embora o Governo Federal minimize o avanço da doença, o modo como ela cada vez mais atinge conhecidos por todo o lado, dá uma concretude à tragédia que não é possível ignorar. Não se sabe até onde os militares são capazes de ir com Bolsonaro, sabe-se que o Centrão é volúvel e segue a maré da opinião pública, a Rede Globo costura a narrativa contra Bolsonaro, do mesmo modo que a omissão de medidas federais limitam o discurso de que a pandemia é responsável pelos desempregos e miséria crescentes. Com isso, e a pauta das CPIs e do impeachment colocada na sociedade, a tendência, segundo os parlamentares, é que Bolsonaro continue sangrando.
Na sexta-feira (22), o Observatório da Democracia promoveu, por videoconferência, a mesa Congresso, Momento e Opções Políticas, que faz parte do Ciclo Diálogos, Vida e Democracia. Esta edição só com líderes de partidos na Câmara dos Deputados, foi coordenada pela deputada federal Perpétua Almeida(PCdoB-AC). A mesa virtual contou com os deputados federais: Alessandro Molon (PSB-RJ), Ênio Verri (PT-PR), Wolney Queiroz (PDT-PE), Fernanda Melchionna (Psol-RS) e Joenia Wapichana (Rede-RR).
O objetivo do encontro foi compreender o estado atual do legislativo no combate a pandemia do coronavírus e à crise política e econômica que assola o Brasil. Foi uma oportunidade de acompanhar um debate pluripartidário sobre os embates que acontecem hoje naquela Casa Legislativa. Embora a “live” tenha ocorrido antes da divulgação pelo STF do vídeo da reunião ministerial, já era previsto o desgaste que ele representaria, conforme crimes do presidente e, mesmo de ministros, fossem expostos.
“O Congresso assume o protagonismo, junto com o STF, diante do vácuo do Governo Federal”, declarou Perpétua. Na opinião da deputada, o governo Bolsonaro aposta no caos. “Ele quer, de fato, que alguns passem fome. Ele quer ver convulsão social para que lhe reste agir”, disse ela, sobre a tendência autoritária do presidente.
Ela ainda acrescentou que essas tendências se expressam na nota do general Heleno, que mostra que Bolsonaro quer dirigir o país sozinho, sem as instituições. Na nota, ele ameaça o STF, caso Bolsonaro seja obrigado a entregar o celular à Justiça, diante de investigações sobre interferência do presidente na Polícia Federal.
Verri explicou que o impeachment depende de pressão popular, seja nas pesquisas ou nas redes sociais. Bolsonaro tem 25% de aprovação, que é muito pouco, e segue declinando, mas isto representa 50 milhões de brasileiros. “Para a população mais pobre, os R$ 600 que nós conseguimos aprovar contra a vontade dele, deram uma sobrevida a Bolsonaro, pois acreditam que é mérito do governo. A medida que ele derrube esse auxilio emergencial, pode mudar a aprovação do governo. Outra pesquisa mostra que conforme a pessoa tem um familiar atingido pela covid-19, ela muda de opinião. Infelizmente, é isto que indica que a pressão pelo impeachment será maior”, ponderou.
O líder petista explicou que o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), sendo um liberal democrata, não vai colocar o impeachment para votação se não tiver votos suficientes para isso. “Hoje não há votos suficiente, mas não porque o centrão foi para o apoio ao governo. O centrão tinha ministros no Governo Dilma, e, numa noite, deixaram de ser ministros para votar pelo impeachment dela. O centrão vai conforme a marcha dos fatos”, afirmou.
Molon disse que o campo progressista está com a população, que, pouco a pouco, vai percebendo que foi enganada “por alguém que dizia combater a corrupção e que usa o governo e interfere na Polícia Federal para proteger a corrupção praticada por um de seus filhos”.
Pode não haver apoio suficiente para o impeachment na Câmara dos Deputados, mas, na sociedade, “o apoio ao governo está desmilinguindo”. “Era 40%, caiu para 36% e agora é 25% e vai continuar caindo, conforme as pessoas percebam que se morre por causa de Bolsonaro”, garante ele.
Ele admite que a figura do vice-presidente Hamilton Mourão não traz nenhuma tranquilidade, diante do artigo “muito ruim” publicado com ameaças às instituições. O artigo na imprensa assume uma postura autoritária diante de instituições como a imprensa.
“A PEC 37 é muito boa porque acaba com a conspiração dos vices, que parece que virou mania aqui no país. Permitir que Bolsonaro continue fazendo o que faz, nos tornaria cúmplices dos crimes dele”, disse o deputado do PSB, elogiando a iniciativa do PT.
O deputado Queiróz mencionou a leitura recente do livro Como as Democracias Morrem?”, de Steven Levitsky Daniel Ziblatt, que analisam as razões pelas quais países perderam suas conquistas democráticas. Embora estejam estudando o processo norte-americano com a eleição de Donald Trump, o líder do PDT fica impressionado como o texto dialoga com a realidade brasileira sob Bolsonaro.
Para ele, todos estes sinais estão presentes aqui e os parlamentares estão “diante do portão que impede a chegada dessa ditadura”. “O Congresso tem que ser o cão de guarda da democracia, não o cachorrinho de estimação. Temos essa dupla responsabilidade por zelar pelos valores democráticos, que têm sido constantemente aviltados e desrespeitados”, defendeu.
Ele salientou que impeachment não é remédio pra governo ruim, citando o presidente de seu partido, Ciro Gomes. Para governo ruim o remédio é a eleição. “Mas impeachment é para governo que comete crime de responsabilidade. Não pedimos impeachment porque não gostamos do governo Bolsonaro, mas são vários os crimes de responsabilidade”, afirmou.
Para a líder do PSol, para além da covid-19, derrotar Bolsonaro seria uma “medida sanitária”, referindo-se a tudo que ele faz para dificultar o achatamento da curva da epidemia, além de ir a manifestações antidemocráticas, onde as pessoas expostas estão se contaminando.
Ela avalia que há 34 bons instrumentos de impeachment por crime de responsabilidade. “A nossa contradição é não poder chamar manifestações de rua com a dimensão que poderiam ter”, lamentou.
“A história mostra que a extrema direita nunca cai de podre, ela precisa ser derrotada. Temos nossas diferenças programáticas, mas precisamos buscar sempre a unidade de ação para derrotar o autoritarismo e o obscurantismo”, defendeu Fernanda.
Joênia disse que a Rede não apenas fez o pedido de impeachment do presidente, como de ministros como Ricardo Salles (Meio Ambiente). Liderando por Marina Silva, o tema do meio ambiente é basilar para a Rede, que também é caro ao governo Bolsonaro. “É um conjunto de retrocessos pra todo lado”.
Ela acredita que foi a união do campo progressista que fez a diferença na defesa da população indígena. “Os povos indígenas mostram que a resistência, união e coletividade, além de dizer o que é importante para as novas gerações, que nos faz ainda estarmos aqui depois de quinhentos anos”.